23/02/2011

Diálogo :Mecanismo de partilha de ideias e de socialização dos desafios


1.  Introdução

Gostaríamos de agradecer a colaboração, as observações e os conselhos que nos foram dando ao longo do ano de 2010. Esperamos continuar a contar com a vossa participação entusiástica neste blog ao longo deste ano. Como dissemos, esta página não vai parar, não, pois ela abre-nos mais uma janela de contacto com os nossos compatriotas, no País e no estrangeiro. Para abrir o debate deste ano trazemos o tema acima enunciado.
O nosso movimento de libertação, desde o seu alvor, integrou na sua cultura política algumas das mais marcantes características do moçambicano, nomeadamente a pendência à gregariedade e ao sentimento de re-encontro com a sua auto-estima quando observa que é tratado como um ser irrepetível, com sentimentos idiossincráticos e com os seus direitos respeitados. É na interação, no diálogo e na confrontação dos pontos de vista e subsequente criação de consensos que se realizam aqueles postulados. Os comícios populares, as reuniões dos órgãos bem como a instituição da unidade-crítica-unidade foram fundamentais para sedimentar a auto-estima, o sentido de pertença e de ser útil ao colectivo.
Esta cultura política no movimento libertador emerge, floresce e consolida-se liderado por moçambicanos que tinham crescido debaixo de um regime que não lhes dava oportunidade de livre expressão nem de diálogo com o poder instituído. Era um poder que respondia a essas exigências com vilipêndio, humilhação, repressão, prisão, desterro e assassinato.
O inveterado “não” ao diálogo, das autoridades coloniais, era temperado com manipulações de ordem psico-social que procuravam corroer a nossa auto-estima, diminuir a nossa capacidade de criatividade e obliterar a nossa visão de um futuro melhor construído por nós próprios. Acrescente-se a isto, a estratégia colonial que explorava, provocava e exacerbava as diferenças na base da tribo, da região e da raça, para fomentar desconfianças, hostilidades e divisões entre nós. São divisões que interferiam com a formação da consciência de Nação e com a possibilidade da formação de uma frente única e unida contra a dominação estrangeira.

2.  A evolução do diálogo institucional
Como dissemos, o diálogo integra a nossa cultura política, particularmente desde o alvor do nosso processo de libertação e tem sido a forma de despertar, num crescente número dos nossos compatriotas, a sua capacidade de realizar os seus sonhos individuais e os ideais do nosso maravilhoso Povo. A Unidade Nacional foi a primeira e principal plataforma em que assentou e prosperou a cultura de diálogo.
v É no diálogo que se socializam os desafios e se forja uma agenda comum;
v É no diálogo que se identificam as potencialidades de uns e de outros e se define a forma de promover a sua complementaridade;
v É no diálogo que se consolida a determinação de todos trabalharem para a realização do mesmo ideal. 
Ao longo dos tempos fomos evoluindo para plataformas que permitem um diálogo institucional cada vez mais especializado. Na área da mulher, por exemplo, temos organizações que congregam profissionais como juristas, académicas, camponesas e empresárias. Na área da juventude, temos organizações que intervêm na área empresarial, estudantil, humanitária, sanitária, educacional, artística, cultural e política. Na área empresarial temos organizações como os Mukheristas, a ASSOTSI, AIMO, a Associação dos Micro-Importadores de Moçambique, a FEMATRO e a UNAC. Temos também, na área profissional, a Ordem dos Médicos, a Ordem dos Engenheiros e a Ordem dos Advogados, a Associação dos Economistas e o embrião da Ordem dos Contabilistas e Auditores.
Na nossa Pátria Amada nasceram e consolidaram-se as associações da sociedade civil que congregam interesses que incluem o ambiente, a conservação do património cultural e histórico, a dívida externa, o desenvolvimento rural, os direitos humanos, a transparência política e económica, a governação corporativa, a literatura, a música e as artes. Nas diferentes religiões que integram o nosso mosaico sócio cultural encontramos congregações constituídas para responder a interesses específicos, sejam eles de natureza teológica, etária ou do género.
Os órgãos de comunicação social também se expandiram, quer em termos de número, quer em termos de representação geográfica quer ainda em termos de especialização ou de programas especializados. Por outro lado, as Tecnologias de Informação e Comunicação estão mais próximas de muitos mais moçambicanos. Na imprensa e nesta gama das Tecnologias de Informação e Comunicação, incluindo as redes sociais, os moçambicanos, representando diferentes organizações da sociedade civil, sensibilidades e interesses, têm dialogado entre si e com o Governo e com outros órgãos do Estado. São formuladas críticas, avançados conselhos e providenciados esclarecimentos, num exercício que também contribui para o crescimento do sentido de cidadania.
A Presidência Aberta e Inclusiva e as suas réplicas a outros níveis da nossa governação deve ser encarada no mesmo contexto de promover e aprofundar o diálogo institucional nesta bela Pátria dos que ousaram lutar. Para o contexto e realidade do nosso país, a Presidência Aberta e Inclusiva, especificamente, é um poderoso instrumento de construção da nossa identidade como um Povo, como uma Nação. Está no cerne da nossa cultura política manter um contacto estreito e contínuo com o nosso maravilhoso Povo e, neste contexto, a Presidência Aberta e Inclusiva é uma forma insubstituível de prestarmos contas a quem nos conferiu o mandato de liderar os seus destinos. Numa perspectiva pedagógica, através deste mecanismo, os moçambicanos entram nos meandros da governação e em contacto com os seus dirigentes. Ao apresentarem e discutirem os seus problemas, de forma franca e aberta, exercem o seu direito de cidadania, dão forma concreta à natureza democrática do nosso Estado e conteúdo à governação participativa. Trata-se de uma prática que é complementada pelas brigadas que são formadas com o mesmo intuito de promover o diálogo a todos os níveis.
De igual modo, o processo de descentralização, que ganha forma através da autarcização, das assembleias provinciais e da colocação de mais recursos humanos e materiais a nível local, traz um aspecto muito importante: aproxima o poder de decisão para junto do cidadão e dá maior expressão ao diálogo institucional. É neste âmbito que surgem e se consolidam os Conselhos Consultivos Locais, instituições que se constituem em embriões de uma sociedade civil rural mais dinâmica e promotora do desenvolvimento local. Estes órgãos estão a aprimorar continuamente a sua capacidade de avaliar prioridades, viabilidade e sustentabilidade de programas, projectando-se, deste modo, como fóruns de diálogo incontornáveis e como escolas de construção de consensos e aprofundamento da democracia.

3.  Será que dialogamos o suficiente?

Moçambique está na viragem. Em crescente número de parcelas desta Pérola do Indico estão a ser operadas mudanças seja no crescimento da auto-estima dos nossos compatriotas e na sua crença num futuro melhor, resultado do seu trabalho, quer seja na forma de infra-estruturas sociais e económicas. Por exemplo, como podemos, através do diálogo demonstrar que a auto-confiança do moçambicano resulta no auto-emprego que cria e na superação de muitos desafios da vida? Como podemos, através do diálogo, demonstrar que os investimentos na área das florestas, turismo, construção, exploração mineira estão a gerar empregos nunca antes vistos? Como podemos demonstrar, através do diálogo, que a existência de estacões de lavagem de carros nos subúrbios e nas zonas rurais expressam uma qualidade de vida de que mais moçambicanos desfrutam?
Dois desafios parecem emergir no horizonte. O primeiro prende-se com a necessidade de articular não tanto essas mudanças mas o seu impacto e efeito, em cascata, sobre a vida do cidadão. O segundo está ligado à necessidade de abranger o crescente número de organizações da sociedade para que os seus membros sintam a sua contribuição reconhecida e o seu sentimento de re-encontro com a sua auto-estima estimulado. Reconhecendo estes desafios, devemos todos continuar a participar no aprimoramento dos nossos mecanismos de diálogo quer seja no sector público quer seja nas organizações da sociedade civil e entre o Estado e a sociedade. 

Colocada a questão, convidamos os nossos compatriotas para esta reflexão. As vossas contribuições, como sempre, serão bem acolhidas.

Armando Emílio Guebuza
(Presidente da República de Moçambique)