Com muito agrado, temos observado nesta página que a Geração da Viragem está a assumir a sua missão histórica, a de combater e vencer a pobreza. Ficamos mais impressionados ainda por saber que esta temática e o papel desta geração na luta contra este flagelo está a alimentar acalorados debates também noutros blogs, alguns dos quais visitamos. Mas lutar contra a pobreza não é tarefa fácil e, por isso, temos insistido que a pobreza mais difícil de remover está na nossa própria cabeça.
Corre, entre alguns compatriotas nossos, a ideia de que a pobreza é um flagelo invencível. Esta percepção reforça-se quando olham para a sua árvore genealógica e concluem que, tendo os ascendentes sido pobres, deles não se pode esperar outra sorte que não a de também serem pobres. Outros segmentos da nossa sociedade, através de palavras e actos, também reforçam essa percepção e desencorajam o florir da experimentação, da criatividade e do empreendedorismo. No reportório artístico nacional temos criadores que, como intérpretes desses nossos compatriotas e dessas percepções, reproduzem e disseminam essa resignação.
Neste ambiente, a falta de auto-estima instala-se e, a partir daí, essa atitude começa, se assim se pode dizer, a comandar a forma de pensar e de agir desse nosso compatriota. Com o seu amor-próprio desfocado, alguns irmãos nossos acabam não conseguindo visualizar, à sua volta, modelos de sucesso que possam imitar. Não conseguem descobrir oportunidades para melhorar a sua vida e, na pior das hipóteses, encontram nos outros cidadãos os culpados pela sua desgraça. Em resultado disso, tendem a acomodar-se na atitude de mão estendida e a resvalar para a inveja e para o crime.
Olhemos por instantes para o nosso passado e dele retiremos lições para construir e adensar a fé de que nós, moçambicanos, podemos acabar com a pobreza nesta Pátria de Heróis. Neste recuo temporal vamo-nos referir à dominação estrangeira e à chamada guerra dos 16 anos.
Durante cinco séculos, Moçambique esteve sob dominação colonial. Ao longo desse período, inúmeras gerações de moçambicanos nasceram, cresceram e morreram. Inúmeros foram também os moçambicanos que poderão ter crescido a pensar que a colonização era parte da sua vida.
Quando a Geração do 25 de Setembro se organizou para desencadear a Luta de Libertação Nacional, depois de se terem mostrado infrutíferas todas as formas de alcançar a independência, por via do diálogo, houve compatriotas nossos que não acreditaram que a independência seria possível. Mesmo alguns dos que aderiram a esta causa, porque ainda dominados pela incredulidade e pouca fé na vitória, traíram a causa do Povo e capitularam ante o opressor.
Organizamo-nos para esta luta em 1962. Em 1975, 13 anos depois, púnhamos fim à subjugação colonial. Acreditámos em nós mesmos e, por isso, vencemos.
Criar, defender e desenvolver um Estado não é tarefa fácil. Mais difícil ainda é fazê-lo perante regimes hostis à causa da liberdade, da paz e do desenvolvimento, como era o nosso caso, com o regime racista da Rodésia do Sul e do Apartheid da África do Sul. A estes desafios sobrepuseram-se os gerados pelos 16 anos de uma guerra que se saldou em mais de 1 milhão de mortos, milhares de refugiados e deslocados internos. Depois de tantos anos de guerra houve quem não acreditasse no seu fim, como não acreditara na possibilidade da defesa da soberania nacional.
A Geração do 8 de Março emergiu pouco depois do 25 de Abril para se juntar à Geração do 25 de Setembro na formação de quadros e na reconstrução e defesa da Pátria. Mais tarde, ela participaria no resgate e consolidação da paz, anunciada pelo Acordo Geral assinado em Roma, a 4 de Outubro de 1992.
Depois dissemos: com a Independência Nacional e a paz estão criadas as condições para prosseguirmos com a materialização do nosso sonho de 1962: construção da nossa prosperidade e bem-estar.
Porém, como no passado, há incrédulos, aqueles que não acreditam que seja possível vencer a pobreza, um importante passo na materialização desse sonho de 1962. Eis que emerge a Geração da Viragem que, inspirando-se nas vitórias, honras e glórias das gerações do 25 de Setembro e do 8 de Março, compromete-se a levar a pobreza de vencida.
Esta é uma geração porta-estandarte da heroicidade do Povo Moçambicano, imbuída de auto-estima espírito empreendedor e de uma indefectível crença nessa vitória contra a pobreza. Um dos sinais mais importantes da clareza desta geração sobre a missão histórica que carrega nos ombros foi quando decidiu desmistificar a percepção de que os jovens impõem condições para trabalhar no distrito. Vemos hoje como eles não só corporizam e dinamizam o movimento de estudantes do ensino superior que usam parte das suas férias para participar no desenvolvimento do distrito como também se empregam no sector público e privado e desenvolvem projectos pessoais nestas unidades administrativas desta Pérola do Indico.
Porquê acreditamos, como a Geração da Viragem, que a pobreza vai ser vencida em Moçambique? Vamo-nos referir à formação, à cultura de trabalho do moçambicano e à expansão de infra-estruturas como indicadores não só do sucesso que estamos a registar nesta luta contra a pobreza como também da certeza de que vamos vencer este flagelo.
Comecemos então pela formação. O moçambicano aproveita e faz bom uso de todas as oportunidades de formação que se lhe apresentem: presencial, à distância (virtual e ou por correspondência) e semi-presencial. Em Setembro de 2008 visitámos o Centro Provincial de Educação à Distância. Ficámos muito impressionados com o número de compatriotas nossos que, em muitos distritos do País, tirando vantagem das tecnologias de informação e comunicação, aumentam os seus conhecimentos, sem saírem dos seus locais de residência. Com a formação virá a produtividade e melhor uso dos recursos à sua disposição, incluindo o tempo.
O segundo indicador prende-se com a ética de trabalho do moçambicano. Devemo-nos orgulhar de ser um Povo muito dedicado ao trabalho e de sermos persistentes na busca da materialização dos nossos sonhos. Felizmente também somos abençoados com recursos naturais diversos: temos muita água doce, uma vasta gama de micro-climas, o mar, a fauna e a flora, só para citar alguns exemplos. Sobretudo, por causa do nosso génio e mãos dextras, temos estado a mudar as nossas vidas. Basta olhar para as nossas cidades e vilas, os nossos subúrbios, os nossos distritos, todo o lado, vemos mudanças, vemos a vida de cada um de nós a mudar: vejo no lar que temos hoje coisas que não tínhamos ontem! É verdade que ainda temos que resolver o problema da produtividade e da eficiência na exploração dos nossos recursos, incluindo o tempo, e das oportunidades que temos no quotidiano. Tratamos deste assunto quando nos debruçamos sobre a problemática da pobreza urbana.
O terceiro indicador está ligado à expansão das infra-estruturas. Esta Pátria de Heróis está a registar a expansão de estradas, pontes, telecomunicações e electrificação. As estradas e pontes colocam os produtores de gergelim de Mutarara, do amendoim de Nipepe, da batata de Boane, do milho da Gorongosa e do tomate do Chókwè cada vez mais perto do mercado. No âmbito da Presidência Aberta e Inclusiva temos interagido com compatriotas nossos que, explorando as crescentes oportunidades que uma ligação estreita com os mercados oferece, estão a melhorar o seu nível de vida com os rendimentos que daí derivam. A casa de tijolo queimando e de chapas de zinco, a dieta alimentar, a bicicleta e a motorizada testemunham essas melhorias na sua qualidade de vida.
A rede de telecomunicações propicia aos agentes económicos acesso à informação, em tempo real. Por exemplo, com o uso do celular, o produtor de milho de Lugela pode fazer a sondagem nacional da procura e da oferta deste cereal antes de determinar o seu preço.
A electrificação rural cria condições para o surgimento de novas actividades sociais e económicas. Por exemplo, se antes o grosso do pescado capturado tinha que ser seco ou fumado (o que reduz substancialmente seu valor comercial), hoje, mais pescadores podem conservar a sua produção. Mais importante ainda, é que esta actividade ganha maior complexidade com a especialização dos nossos concidadãos em áreas como o aluguer de arcas para conservação do pescado e fornecimento de gelo, transporte do pescado e comercialização a retalho de produtos frescos.
As infra-estruturas dão assim uma nova dinâmica à vida nas nossas cidades e vilas, facilitando o seu abastecimento com a produção nacional e o surgimento de áreas de especialização como processamento, armazenamento, gestão e comercialização. Estes desenvolvimentos abrem, por um lado, espaço para a crescente geração de renda e, por outro lado, para a integração cada vez mais plena da economia nacional entre o campo e a cidade. Estes desenvolvimentos reforçam o nosso apelo anterior no sentido de os actores económicos das zonas urbanas se organizarem melhor para tirar vantagem das oportunidades que surgem e, assim, participarem mais activamente no combate à pobreza urbana.
A experiência mostra que quando a vontade de uns se torna a vontade de todos, então esse colectivo torna-se imparável. Em Moçambique o discurso de luta contra a pobreza foi apropriado e é articulado por todas as gerações de moçambicanos. Por isso, é um discurso institucionalizado e com este enfoque, estamos em condições de ir celebrando as pequenas vitórias como parte dessa marcha imparável. Nesta Pátria de Heróis, nós, os moçambicanos, devemos ser os heróis da nossa própria libertação da pobreza, com cada um de nós fazendo a sua parte.
Como sempre, vamos aguardar pelos comentários e conselhos.
Armando Emílio Guebuza
(Presidente da República de Moçambique)