24/11/2009

A TOPONIMIA: Uma questão de auto-estima, identidade cultural e historia



Uma vez mais sentimos que valeu a pena abrir esta página para interagir com os meus compatriotas. Temos recebido inúmeros conselhos e, mesmo através das percepções que alguns dos nossos compatriotas têm sobre determinado fenómeno, aprendemos que devemos agir deste ou daquele modo. Gostaríamos de reconhecer os elogios e os encorajamentos que nos foram dando sobre a nossa governação e a atenção que nos chamaram sobre diferentes desafios que temos pela frente sendo o de maior destaque a implementação, diríamos até, mais célere, das nossas decisões.
Um apelo que foi lançado de forma recorrente era para que este espaço não parasse depois da campanha. Na verdade, ele não nasceu na campanha, mas durante a campanha, em resposta a pedidos colocados durante a nossa Presidência Aberta e Inclusiva, essa nossa complexa e multidimensional cultura política, essa nossa maneira de colocar o nosso Povo e os seus mais nobres anseios no centro das atenções da nossa acção governativa. Se estiverem recordados dissemos que foi durante a visita que realizámos aos Centros Multimédia Comunitários de Chitima, na Província, de Tete, de Chokwe, na Província de Gaza, e da Catembe, na Cidade de Maputo, que interagimos com os jovens gestores e beneficiários destes Centros. Estes, interpretando o sentimento de outros compatriotas nossos, pediram-nos para com eles nos comunicarmos, fazendo uso das tecnologias de informação e comunicação. Por isso, esta página não vai parar não. Como poderia ela parar se vem enriquecer a nossa cultura política que se fundamenta no diálogo e na busca incessante de conselhos deste povo especial, o maravilhoso Povo Moçambicano?
Como anunciamos logo no primeiro artigo, vamos acompanhando as postagens e todos os nossos compatriotas tenham a certeza de que estamos, efectivamente, a acompanhar o que têm estado a comentar, a sugerir e a criticar. O nosso estilo de trabalho é este e quem já assistiu às nossas reuniões com organizações da sociedade civil, com académico e outros intelectuais na Presidência da República, com os Conselhos Consultivos e com a população em comícios sabe que entramos para esse encontro com um bloco de notas limpo para sair com o mesmo bloco muito bem preenchido com as valiosas contribuições dos intervenientes. Não é nosso estilo comentar necessariamente tudo o que é dito nesses encontros embora guardemos tudo como lições, como conselhos. Por isso, caro compatriota, os seus conselhos são e serão úteis na nossa governação, pois este canal já está a trazer uma nova dimensão à Presidência Aberta e Inclusiva.
Para nós seria vantajoso que todos os nossos interlocutores se apresentassem com nomes próprios e, sobretudo, com um pequeno perfil. Assim teríamos uma ideia mais clara sobre com quem estamos a interagir tendo presente a sua formação, idade e ocupação. Mas isto não é obrigatório nesta página.
Hoje gostaríamos de abordar um novo tema: A toponímia. De um modo geral, os topónimos encerram uma parte da nossa identidade cultural, do nosso percurso histórico e são uma inestimável fonte da nossa auto-estima, do nosso orgulho de sermos moçambicanos. Por isso, na nossa governação está sempre presente a necessidade de aproximar a nossa toponímia à realidade social, cultural e política do nosso Moçambique, livre e independente. Foi neste contexto que substituímos, por exemplo, os nomes de localidades, de instituições educacionais e de ruas, impostos pela colonização, por nomes que reflectem a nova realidade da nossa Pátria Amada. Também neste exercício se enquadra o papel que conferimos aos líderes comunitários e às cerimónias de evocação dos antepassados.
Temos consciência de que a substituição dos topónimos não está ainda completa. Com efeito, temos, por exemplo, ainda muitos nomes geográficos que não têm nenhuma relação com a nossa realidade de Estado soberano. Por outro lado, temos também casos de substituições que não foram ao encontro da forma como esses topónimos são pronunciados pelos falantes da língua-fonte. Foi assim que ficamos com Cuamba em vez de Mkwapha, de Gondola em vez Gandura e por aí fora. Por isso, a referência desse local em português em nada se aproxima da referência usada pelo intérprete e pela população. Este problema é exacerbado pela ortografia que se usa para as línguas moçambicana onde nomes que deviam ter os mesmos símbolos acabam confundindo o leitor chegando-se à situação de só quem escreveu ou aquele que partilha dessa “escola de formação ortográfica” é que é capaz de ler. Um dos desafios que temos, pois, é como reflectir a pronúncia corrente na língua do topónimo, um processo a que se deve chegar também através de uma ortografia padronizada.
Quando falamos de toponímia outras duas questões fundamentais se levantam: por um lado, a auto-estima e o reforço da nossa identidade e sentido de história. Por outro, a necessidade de encararmos a escrita correcta e padronizada dos topónimos como uma medida que vai contribuir para a divulgação dessa ortografia dentro da nossa sociedade.  
Há uma outra dimensão social que nos interessa destacar. Os topónimos encerram importantes traços da nossa história, outros são repositórios de lendas, de saberes e de exemplos de talento e de bravura dos nossos antepassados. Este manancial epistemológico nem sempre se encontra registado e disponível para a sua divulgação mesmo nas escolas inseridas nesse espaço geográfico e nas comunidades donas desse nome. O que podem os moçambicanos fazer para divulgar estes ricos elementos da nossa identidade? Não vamos aqui entrar na antroponímia mas queríamos encorajar os nossos compatriotas a habituarem-se a desenhar e a conhecer as suas árvores geneológicas, os mais velhos passando essa informação aos mais nossos e estes pelas gerações vindouras. Cada família devia sentir essa responsabilidade de preservar e valorizar a sua história.
A toponímia e a língua têm uma relação simbiótica de grande relevo. Por isso, a sua valorização passa pela valorização das línguas moçambicanas, que não são dialectos, como alguns dos nossos compatriotas erradamente as designam. A sua valorização passa também pela padronização e divulgação da sua ortografia. Neste contexto, a revisão da toponímia só terá sucesso se formos capazes de, primeiro, dar o valor que as nossas línguas merecem. Em segundo lugar, aceitar que elas devem ter uma ortografia padronizada como qualquer outra língua do mundo. Finalmente, que elas são o veículo principal da nossa moçambicanidade de que a toponímia faz parte.
O Governo vai continuar a trabalhar na revisão e substituição dos topónimos, na adequação da sua escrita à ortografia padronizada, com vista a espelhar a pronúncia dos falantes da língua-fonte e a reflectir a realidade do nosso Moçambique soberano.
A questão que colocamos para abrir este debate é esta: o que podemos nós, os moçambicanos, particularmente a nossa juventude, mais fazer neste exercício todo? Como sempre contamos com os vossos conselhos.

Armando Emílio Guebuza
(Presidente da República de Moçambique, Presidente da FRELIMO e Candidato Presidencial da FRELIMO)